Resenha: Utopia Selvagem

O que dizer sobre esse livro? Simplesmente, fantástico! Uma obra que traduz bem a forte cultura brasileira, seus contornos e suas misturas, características marcantes que fazem do povo brasileiro um exemplo de como a miscigenação racial não envergonha nem desvaloriza uma nação. A obra em questão, mediante uma história fictícia, faz um mapa da cara do Brasil e de sua estrutura social a partir da figura do branco, do índio e do negro, além de trazer à superfície temas que ainda hoje são levantados e debatidos nos mais variados estratos da nossa sociedade.

Os trechos a seguir foram separados por mim, pois gostaria de dividir com vocês toda a essência crítica e reflexiva contida neles:

“O que hoje se vê — diz ele [Pitum], indignado — é nossa Pátria ser conduzida pelo caminho da perdição. O incesto é descaradamente promovido. A pederastia é publicamente exaltada. A lesbiania floresce sem disfarces. A xenofobia é estimulada pelo retorno ao nacionalismo brizolista. A pornografia tanto comove João que ele cai em lágrimas. A própria Santa madre se achincalha, deixando órfão o povo de Deus. Nação nenhuma suportaria tamanha sangria nos seus núcleos de fé e de razão.”

“Os homens, uns malandros, é verdade que caçam e pescam em duras jornadas; mas depois descansam dias, balançando na rede, cafungando, filosofando e rezando. As mulheres são mais ativas. Fora da aldeia, plantam roça e colhem, apanham água e lenha, carregam carga. Dentro de casa, cozinham e amamentam, fornicam e mexericam. O sonho dá aos Galibis [tribo indígena] o que a TV Globo dá a nós, brasileiros: engabela, seduz e consola. É até melhor porque não quer vender seguros nem sabão português. […] Sem as ilusões da TV, o brasileiro morria de tristeza com a vida que tem.”

Utopia Selvagem aborda uma temática densa, complexa, detalhada e muito bem desenvolvida pelo saudoso Darcy Ribeiro (fotos). Sou um pouco suspeito para falar dele, já que é meu conterrâneo. Nasceu em Montes Claros, em 1922. Foi antropólogo renomado, ministro da Educação e depois ministro-chefe da Casa Civil, ambos no governo do presidente João Goulart, vice-governador do Rio de Janeiro em 1982, secretário de Cultura, coordenador do Programa Especial de Educação, e senador da República de 1991 até sua morte, em 1997. Com uma trajetória dessas, não há como dizer que sua obra tenha conteúdo desinteressante ou sem importância, certo?

Recomendo a todos que desejam um livro que ofereça algo maior que apenas uma boa história.

Um imenso abraço aos que leram até aqui e fiquem atentos, pois a próxima resenha que farei será sobre Alta Tensão, da editora Arqueiro.

Andrew Magalhães