Resenhas

Resenha: Mensur – Rafael Coutinho

Nome do Livro: Mensur
Nome Original: Mensur
Autor(a): Rafael Coutinho
Editora: Quadrinhos na Cia
Ano: 2017
Páginas: 200
Nota: 5/5

Um dos artistas mais talentosos do quadrinho brasileiro, Rafael Coutinho volta à forma longa neste que é seu mais ambicioso trabalho desde Cachalote, romance gráfico criado em parceria com o romancista Daniel Galera. Em Mensur, Coutinho conta a história do Gringo, um andarilho que percorre cidades brasileiras em busca de bicos e trabalhos manuais. Todavia, o Gringo é também um dos últimos praticantes do mensur, uma luta de espadas surgida na Alemanha do século XV entre estudantes universitários. Enquanto lida com seus próprios fantasmas e obsessões, um caso amoroso pode colocá-lo em conflito com seu passado e com segredos que jamais deveriam vir à tona. Um dos mais originais e impressionantes trabalhos do quadrinho brasileiro, Mensur é uma saga pessoal e um épico íntimo da busca por um lugar e, sobretudo, por algum tipo de paz.

O autor Rafael Coutinho dedicou sete anos para a conclusão de Mensur e seu trabalho é digno de todo o reconhecimento. Trata-se de uma graphic novel densa, repleta de crítica social e que deve ser lida com atenção aos detalhes. Certamente retornarei para uma segunda leitura.

A qualidade dos diálogos é um dos pontos altos, assim como a fluidez da paginação. A obra é composta inteiramente em preto e branco, apesar do vermelho que verte do rosto na capa, e intercala batalhas de espadas com passagens nas quais prevalecem o silêncio e a introspecção. Gringo, o protagonista, é um andarilho que busca fazer as pazes com seu passado e deixa de lado a carreira de médico para se aventurar em trabalhos braçais, quase sempre em caráter temporário. Nos tempos de faculdade, Gringo era um praticante de mensur, uma espécie de luta de espadas outrora praticada na Alemanha e cujo objetivo era marcar a face do adversário. Para uma república estudantil repleta de homens, os duelos secretos eram uma excelente oportunidade de provar a masculinidade. Até que um dia, porém, um episódio infeliz fez com que esse “clube da luta” se dissolvesse sem deixar muitas pistas.

Gordo, um dos membros dessa fraternidade, acabou se formando em medicina juntamente com o restante da turma. Hipócrita e misógino, vive uma vida de aparências e se distancia de Gringo à medida que o antigo amigo se mostra disposto a investigar feridas não cicatrizadas pelo tempo. Apesar da postura opressora em relação às mulheres, Gordo exibe uma faceta vulnerável que não justifica suas ações, mas o humaniza. Da mesma forma, Gringo tenta se apresentar como um exemplo de conduta mas esbarra na dificuldade de se relacionar com outras pessoas. Deixou de visitar sua mãe por sete anos, por exemplo. “Vergonha!”, grita a vizinha quando o vê chegar para reparar o erro.

Coutinho, em diversas cenas, dá exemplos de situações que mostram aquilo que há de pior na sociedade brasileira, como o machismo, as corrupções do dia a dia, a violência, a superficialidade, o preconceito racial e a burocracia. Assim como o nosso “jeitinho”, a “cultura do estupro” é um tema recorrente ao longo da obra e pouco é feito para impedir que ela se propague.

Recomendo bastante a leitura de Mensur e já resolvi que 2017 será o ano em que eu finalmente passarei a ler mais quadrinhos nacionais. Fora que esta edição em capa dura está belíssima, impecável.

Ronan Sato

Especialista em assuntos aleatórios. Apesar de descendente de japoneses, não sabe afirmar com certeza se prefere comida indiana ou sushi

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