Resenha: 12 anos de escravidão, por Solomon Northup (segunda opinião)
Nome: Doze anos de escravidão
Nome original: Twelve Years a Slave
Autor: Solomon Northup
ISBN:9788563560896
Tradutor: Caroline Chang
Páginas: 280
Ano:2014
Nota: 5/5
Onde comprar: Cia das Letras
Considerada a melhor narrativa já escrita sobre um dos períodos mais nebulosos da história americana, Doze anos de escravidão narra a história real de Solomon Northup, um negro livre que, atraído por uma proposta de emprego, abandona a segurança do Norte e acaba sendo sequestrado e vendido como escravo.
Depois de liberto, Northup publicou o relato contundente de sua história, que se tornou um best-seller imediato. Hoje, 160 anos após a primeira edição, Doze anos de escravidão é reconhecido como uma narrativa de qualidades excepcionais. Para a crítica, o caráter especial do livro deve-se ao fato de o autor ter sido um homem culto que viveu duas vidas opostas, primeiro como cidadão livre e depois como escravo.
Os atos obscuros da humanidade jamais devem ser esquecidos, sequer pode-se cogitar tal possibilidade. O período escravagista deve ser lembrado para que as gerações presentes e futuras fiquem atentas para os males que a defesa da superioridade racial pode suscitar.
12 anos de escravidão não é apenas um ótimo livro, é um documento histórico que retrata fielmente o sofrimento dos escravos do Sul americano, mais especificamente da região de Bayu Boeuf, estado da Louisiana. Um livro essencial para estar na estante de qualquer pessoa.
A história é narrada pelo próprio Solomon Northup, cidadão livre de New York, vítima de um engodo, sendo sequestrado e vendido como escravo quando decidiu ir a Washiton D.C em busca de trabalho e na companhia de Hamilton e Brown – os quais ele especula terem participado da tramóia -, situação que perdurou por 12 sofríveis anos. Vê-se que Solomon é um homem bem instruído e culto, além de ser uma pessoa sensata e conhecedora dos seus direitos e garantias como cidadão livre.
“Senti que não havia confiança ou misericórdia em homens desprovidos de sentimentos; e, voltando-me para o Deus dos oprimidos, deitei a cabeça sobre minhas agrilhoadas mãos e chorei lágrimas amargas.”
Enclausurado, após dias de inconsciência, ele acorda numa escuridão total, agrilhoado e humilhado, é aí que tem início seu calvário. Obrigado a esquecer seu passado de liberdade, sua condição de cidadão americano por imposição do seu sequestrador, um contrabandista chamado Burch, após uma longa sessão de espancamento que Solomon compara “às agonias flamejantes do inferno”, sepultando dali em diante o feliz Solomon Northup. Após esse dia seu nome passou a ser Platt.
Seu primeiro “proprietário”, que perdurou por dois anos, foi um pastor protestante e fazendeiro chamado William Ford, que é descrito como um homem justo e de bom coração. Porém, o surgimento de dificuldades financeiras o obriga a se desfazer de seus escravos. Daí em diante Solomon não teve muita sorte com seus senhores, sendo um deles o carpinteiro John M. Tibeats, um homem de parcos recursos que recebe Solomon a título de pagamento de um débito, todavia, por ser mais valioso o Sr. Ford manteve uma alienação fiduciária de quatrocentos dólares, o que, mais tarde, serviu para salvá-lo, como ele mesmo afirma.
O seu terceiro proprietário foi um fazendeiro, não muito rico, chamado Edwin Epps, sempre amaldiçoado e descrito como uma pessoa vil e sem bom senso por Solomon que o serviu por oito anos até o momento em que foi resgatado, em 1853, por Henry B. Northup com a ajuda de um homem chamado Bass. As descrições dos maiores flagelos são relatadas quando ele passa a trabalhar na fazenda de Epps, que aplicava chibatadas indiscriminadamente em seus escravos, além de fazê-los obedecer aos seus desejos mais alucinados quando estava sob os efeitos do álcool.
Ler este livro me fez perceber, pela primeira vez, como era a pequena parcela do sofrimento de um escravo. Um relato raro, visto que naquela época não se permitia a instrução dos escravos, até pelo fato de que – pelo que percebi – não eram considerados sujeitos de direito, mas objetos tutelados e protegidos como propriedade. Entretanto os senhores de escravos concediam pouquíssimas benesses, como, por exemplo, a folga de natal em que eles podiam se reunir para festejar e tinham o domingo reservado para descansar ou, se lhes aprouvesse, trabalhar de forma remunerada, sendo esse um costume praticado por todos os donos de escravos.
A narrativa não é tão leve e em certos trechos são feitas longas descrições, como a descrição minuciosa da colheita de algodão e da moagem da cana de açúcar. De resto, a linguagem é clara, mas às vezes precisamos consultar um dicionário para clarear as ideias. Não é uma história repleta de mistérios e reviravoltas, contudo é uma narrativa que emociona e que nos impulsiona a cada página. Durante a leitura tive vários sentimentos; desde compaixão até ódio.
Os sentimentos de Solomon são bem diversificados e controversos. Por algumas pessoas ele nutre desprezo, já em relação a outras ele até compreende, culpando o “sistema escravagista”. Conforme resenhado pelo amigo Jairo Canova, em determinados momentos o próprio Solomon foi obrigado a infligir sofrimentos a seus companheiros escravos no intuito de impor a disciplina, porém, ele busca demonstrar arrependimento e se justifica revelando que era obrigado a fazê-lo sob pena de ser castigado e, assim, tenta amenizar a situação afirmando que combinava uma encenação com os companheiros, uma vez que adquirira uma grande habilidade em fazer o chicote estalar sem tocar a pele da vítima a ser flagelada.
“Não é culpa do proprietário de escravos se ele é cruel; antes, é culpa do sistema no qual ele vive. Ele não consegue se opor à influência do hábito e das relações que o cercam. Ensinado desde a mais tenra idade por tudo o que vê e ouve que a vara foi feita para as costas do escravo, na idade madura não consegue mudar de opinião.”
Não há o que reclamar sobre essa edição, o selo Penguin realizou um ótimo trabalho, tanto a diagramação como a revisão ficaram perfeitas, as páginas amareladas permitem que a leitura transcorra sem maiores problemas. Durante a leitura há notas de rodapé com informações interessantes e ao final do livro temos um pósfácio escrito por Henry Louis Gate Jr. com imprecações convenientes sobre a vida de Solomon, sobre o período em que a história é narrada e sobre o filme homônimo dirigido por Steve McQueen.
O filme foi ganhador da estatueta do Oscar 2014 como melhor filme. “12 anos de escravidão” ganhou três prêmios no evento: Roteiro adaptado, melhor atriz coadjuvante e melhor filme. (fonte: cinema UOL)