O Quarto ao Lado | Crítica
O diretor Pedro Almodóvar tem, nos últimos anos, se desnudado (no sentido figurado) e revelado de forma mais aberta suas influências e inspirações como cineasta. Em Dor e Glória (2019), ele nos entregou um filme quase autobiográfico, enquanto, mais recentemente, tem realizado obras que dialogam diretamente com grandes clássicos do cinema. Um exemplo claro é Estranha Forma de Vida (2023), que surge como uma resposta a O Segredo de Brokeback Mountain (2005), de Ang Lee. Em seu mais recente filme, Almodóvar faz uma citação explícita a uma das obras mais sublimes da história do cinema.
No início do filme, conhecemos Ingrid (interpretada por Julianne Moore), cujo nome faz referência à escritora Sigrid Nunez, autora do livro O Que Você Está Enfrentando (2021), no qual Almodóvar baseou sua história. Ingrid, que está em meio ao lançamento de seu livro, descobre que sua amiga Martha Hunt (Tilda Swinton) está lutando contra um câncer. Ela, então, decide interromper sua turnê de autógrafos para visitá-la. Durante a conversa, Martha abre seu coração sobre sua relação conturbada com a filha, revelando a trajetória que culminou na trágica ruptura entre as duas.
O Quarto ao Lado marca de forma notável o primeiro longa-metragem de Almodóvar inteiramente filmado em inglês. Há um momento crucial no filme em que Martha conta a Ingrid sobre seu passado, e a narrativa introduz uma “história dentro da história”. Essa subtrama não interrompe o fluxo do filme; pelo contrário, ela enriquece a narrativa principal, revelando como eventos trágicos moldaram a relação de Martha com sua filha e, por extensão, como tragédias pessoais nos transformam ao longo da vida.
Paralelamente, Martha compartilha seus próprios planos para o futuro, enquanto enfrenta um câncer metastático, sem muitas perspectivas de cura, ela decide aluga um luxuoso Airbnb em uma casa de campo e convida Ingrid para passar alguns dias com ela. Lá, elas engajam-se em profundas conversas literárias, revivem a vida de Martha como correspondente de guerra do New York Times, discutem os horrores que ela testemunhou, assistem a filmes e refletem sobre a vida e a morte. Se, em Persona – Quando Duas Mulheres Pecam (1966), de Ingmar Bergman, as personagens Elisabet (Liv Ullmann) e Alma (Bibi Andersson) competem e, de certa forma, se fundem em um ambiente frio e hostil, aqui temos duas mulheres que se apoiam e se encorajam em um cenário bucólico e acolhedor.
Enquanto tenta ser um pilar de apoio para sua amiga, Ingrid vive um grande dilema pessoal. A única pessoa com quem pode contar é Damian Cunningham (John Turturro), alguém que compartilha um passado com Ingrid e Martha. Damian tem uma visão pessimista do mundo, especialmente em relação à ascensão da extrema direita e às catástrofes climáticas. Nesse aspecto, Almodóvar demonstra estar profundamente conectado com o espírito de nosso tempo (o zeitgeist, termo alemão que significa “espírito da época”).
Definitivamente, O Quarto ao Lado é uma das obras mais bonitas e corajosas de Almodóvar. A atuação de Tilda Swinton está impecável, e o filme merece ser lembrado e reconhecido por muitos anos como uma de suas grandes obras.
Ficha Técnica:
Estréia: 24 de outubro de 2024
Titulo Original: The Room Next Door
Direção: PEDRO ALMODÓVAR
Roteiro: PEDRO ALMODÓVAR
Elenco: Tilda Swinton, Julianne Moore, John Turturro, Alessandro Nivola, Sarah Demeestere, Paolos Luka Noé, Alex Hogh Andersen
Compositor: Alberto Iglesias
Produtor Executivo: Agustín Almodóvar
Produtores: Esther Garcia, Pedro Almodóvar
Diretor de Fotografia: Eduard Grau
Produtor: Pathé Films
Produtor: El Deseo
Distribuição: Warner Bros