Crítica “Corpo e Alma”

Corpo e Alma ( Testről és lélekről, 2017)
Duração: 1H56 min
Diretores: Ildikó Enyedi
Roteirista: Ildikó Enyedi
Elenco: Géza Morcsányi, Alexandra Borbély, Zoltán Schneider
Gênero: Drama, romance
Classificação indicativa: 14 anos

Duas pessoas introvertidas descobrem que dividem o mesmo sonho todas as noites. Intrigados, incrédulos e assustados, eles tentam recriar o que acontece durante a noite enquanto estão acordados.

 

Duas pessoas solitárias, se encontram em dois locais diferentes. Na esfera do possível, ao trabalharem lado a lado e, na esfera do imaginário, sem saberem compartilharem o mesmo sonho. Em seu novo filme, a diretora húngara Ildikó Enyedi transita entre esses dois universos para nos contar a história de amor e amizade entre Endre (Géza Morcsányi) e Mária (Alexandra Borbély) duas pessoas isoladas em suas particularidades.

Enquanto Endre lida com as dificuldades de uma paralisia no braço esquerdo, Mária possui uma série de limitações que a tornam inibida ao contato físico. Em meio ao ambiente – hostil – de trabalho em um abatedouro, surge entre eles uma atração que ultrapassa essa realidade. Eles compartilham o mesmo sonho. Em cada noite, ao dormir, eles se transformam em um cervo e uma cerva, que caminham por uma mata em plena nevasca.

Mas, no mundo real, esse contato não é tão fácil. Ambos são tolhidos emocionalmente. Mária encena em casa, o passo a passo do que pretende falar e de como agir, antecipando e idealizando o diálogo com Endre. Ele, um observador, pensa muitas vezes antes de agir. Assim, ambos se limitam cada vez mais em se aproximar.

A diretora usa do ambiente de trabalho deles para reforçar o clima de frieza da sociedade contemporânea. Sem medo de demonstrar a falta de empatia, ela abusa do foco em cima das ações dos que abatem o gado. Chega a mostrar detalhadamente o passo-a-passo dessa rotina, num ambiente exageradamente claro, marcado por uma única cor quente, o vermelho do sangue do abate.

Nos outros espaços desse local, a iluminação ou remete a luz natural ou a uma luz artificial gélida, como as de elevadores. Em casa, os dois se encontram em climas semelhantes, ou então no escuro. Ela esconde essas pessoas, assim como elas se escondem de uma possível interação. Essa proximidade acontece com muita cautela, desencadeada pela coincidência  do sonho compartilhado, descoberta em uma investigação.

Além das personagens principais, podemos observar essa falte de compromissos nas coadjuvantes. Há o casal, que vive de aparências, na qual o homem diz ser o dominante, mas se submete as ordens da esposa e, o novo funcionário que age como “uma galo novo na granja”, tentando conquistar todas as mulheres com as quais trabalha.

Abordar a individualidade e o isolamento na sociedade contemporânea, em uma história que se assemelha a uma fábula é, para mim uma maneira delicada de fazer o espectador entender quão complexas são as relações atualmente. Nem tanto pelo que um casal deve doar um ao outro, mas pelo que cada um traz em si de anseio.

O título determina bem o que vemos na relação entre os dois. Do espiritual ao carnal, consumado a cada avanço promovido pela quebra das barreiras pessoais. Um filme terno que te conquista mesmo mostrando algo simples, como o agrado em receber um pouco de sol na pele.

Nota: 5/5

Assista aqui ao trailer: