Resenha: Submissão, de Michel Houellebecq
Nome do Livro: Submissão
Nome Original: Soumission
Autor: Michel Houellebecq
Tradução: Rosa Freire D’Aguiar
Editora: Alfaguara
ISBN: 9788579623820
Páginas: 236
Ano: 2014
Nota: 3/5
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França, 2022. Depois de um segundo turno acirrado, as eleições presidenciais são vencidas por Mohammed Ben Abbes, o candidato da chamada Fraternidade Muçulmana. Carismático e conciliador, Ben Abbes agrupa uma frente democrática ampla. Mas as mudanças sociais, no início imperceptíveis, aos poucos se tornam dramáticas.
François é um acadêmico solitário e desencantado, que espera da vida apenas um pouco de uniformidade. Tomado de surpresa pelo regime islâmico, ele se vê obrigado a lidar com essa nova realidade, cujas consequências — ao contrário do que ele poderia esperar — não serão necessariamente desastrosas.
Comparado a 1984, de George Orwell, e a Admirável mundo novo, de Aldous Huxley, Submissão é uma sátira precisa, devastadora, sobre os valores da nossa própria sociedade. É um dos livros mais impactantes da literatura atual.
Publicado antes dos ataques terroristas à sede da revista de humor francesa Charlie Hebdo, Submissão prova instantaneamente a atualidade e relevância de seu tema. Detalhe: a última edição da revista antes do ataque trazia uma caricatura de Houellebecq na capa.
O personagem principal é François, um catedrático especialista em J. K. Huysmans (no Brasil a Companhia das Letras publicou a obra mais significativa do autor: Às avessas) que vive em um bairro chinês de Paris. Pessoalmente, ele não tem grandes aspirações ou ambições e é frequentemente manipulado pelo que está acontecendo na França.
Mais da metade do livro é um breve relato da decrépita carreira de François, seus curtos casos amorosos e algumas incursões culinárias. Um humor extremamente sutil permeia toda a obra, como uma sombra que desaparece quando nos viramos. O exemplo mais sórdido é quando, às vésperas de uma eleição presidencial potencialmente violenta que pode mudar a história da França, François resolve fazer turismo pelo interior do país, mesmo que tenha que pular por cima de um ou dois cadáveres pelo caminho. Nas primeiras 100 páginas pensei ter lido a sinopse errada, as páginas não pareciam estar a altura das clássicas distopias a que ele é comparado, o trunfo de Submissão é a piora gradual da sociedade e da apatia da população em aceitar a nova situação como inevitável, à custa do sangue dos rebeldes.
Com frequência lembrei dos quadrinhos Persépolis, da iraniana Marjani Satrapi (publicado no Brasil pela Cia dos quadrinhos). Muitas das ferramentas usadas pelos regimes totalitaristas que Marjani descreve se repetem em Submissão. Um exemplo comum são as pessoas de pouca importância que subitamente recebem altos cargos e salários assombrosos ao se converterem sem fazer barulho, mantendo uma fachada de normalidade e de melhora da situação social do país. Também nesse aspecto se salienta o título Submissão, quando por inércia ocorre a aceitação tácita da regressão social. É quase inacreditável como um país inteiro abandona em poucos meses as conquistas construídas ao longo de décadas.
Adquiri grande empatia por Myriam, amante de François que, por ser judia, foge para Israel junto com os pais antes das mesmo das eleições presidenciais. Essa decisão se torna acertada, pois o novo governo islâmico aceita facilmente cristãos para conversão, enquanto os judeus são sutilmente ignorados como se tivessem desaparecido.
A edição da Alfaguara é de muito boa qualidade, com capa de textura emborrachada, imagem condizente com o conteúdo, nenhuma erro de digitação, fonte de bom tamanho e papel de excelente qualidade, um livro para ter na coleção.